Cresci ao lado do piano de minha irmã
a pedir-lhe Um suspiro, de Liszt: as notas
desencadeadas como o mar, querendo uma
voz, uma sentença, um rastro de silêncio,
que eu, bruto e lírico, ouvia entre pedras
de marfim. O medo a cobrir-me o rosto
sempre que pedia... Era bom sentir a vida
derretendo, se os dedos de outono vestiam-se
de mãe. As cordas do tempo no Essenfelder
– já agora vejo – a se romperem eram
as do meu peito (incapazes de sofrer).
Por mil e uma noites, dentro do teclado,
segui, movendo-se distante – como eu ainda
hoje –, o frágil coração de minha irmã. |