Talvez à maioria hoje mais agrade
a forma, conquanto gore e pouco
helénica, sobre o suplício louco
humano, que um deus por caridade
se diz sofrer ou dar em sacrifício
do mal, que natural nos é. E como
pôde amor, escarnecida a fé,
exposto o lado, o ferro, o orifício?
Lancetado ao regaço da Pietá,
vertendo desse flanco claro pus,
tocando o morno sangue à boa mão,
lambendo o choro manso ao seio seu,
e a longa banda do sudário, a luz
banhando como acordeão do céu,
que arte face a tal morte? Awe, susto,
insídia, o que furta e seu flagelo:
– Porquê morrer connosco preso ao chão
se filho de Deus és? – Mas se eu não for –
diz, de olhos sem raízes, o modelo
– que vos garante então quem serei eu?
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