Nem todo cinema é poesia.
Somente certos filmes raros são poemas
assim como também raros são os poemas.
Exemplo: À bout de souffle de Godard
um poeta de nascença, de mão cheia
antes de ser cineasta de óculos escuros
barba por fazer, descabelado.
Nesta película, feita de piscar de olhos
relances, coração na boca, à flor da pele
dos seus atores: Seberg e Belmondo
e nunca a nudez foi tão nua, embora
o lençol a cobrisse por completo
se debatendo entre amor e morte
traição e entrega, de cortes e mudança
de plano – bruscos – iluminados
pela poética que o verso propicia.
E a trilha sonora, escolhida a dedo, sublinhando
a ação e pensamento, o refúgio e a fuga
entrecortados em pleno sobressalto
da montagem, no corpo a corpo
das imagens, na sensação da sala escura
e se infiltra na percepção do que vi e senti
preso na ponta da cadeira, acossado.