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Eugénio
de Andrade nasceu na Póvoa de Atalaia (Fundão) a 19 de Janeiro
de 1923. Com sete anos de idade acompanha a mãe para Castelo Branco
e em 1932 vão viver para Lisboa. Neste mesmo ano termina os estudos
primários que iniciara na aldeia natal. Por volta dos doze anos,
descobre a biblioteca de um vizinho e começa a ler intensamente
Júlio Verne, Jack London e Alexandre Dumas, os clássicos
românticos portugueses, os romances de Dostoievski, Tolstoi e Gorki
e a poesia de António Botto. Ao autor de Canções
envia, em 1938, uma carta com três ou quatro poemas,
manifestando o desejo de o conhecer. Momento particularmente importante,
pois é nesse encontro com Botto que um amigo deste revela a Eugénio
de Andrade a poesia de Fernando Pessoa, origem de um fascínio ilimitado.
A Pessoa dedicará o seu primeiro livro. O conhecimento da literatura
do poeta dos heterónimos será determinante para a afirmação
de um estilo individual numa direcção oposta à poética
pessoana, naquilo em que esta se mostra distanciada da exaltação
do sensualismo, da afirmação da corporalidade vectores
decisivos no trajecto poético de Eugénio de Andrade (se
queria que a palavra poética se confundisse com o marulhar do meu
próprio sangue, só me restava exactamente escrever de costas
para ele).
Outro grande encontro, a par de Pessoa, é a poesia de Camilo Pessanha.
Dentre os eleitos nomes supremos da poesia de língua portuguesa,
Camilo Pessanha é aquele que para Eugénio de Andrade melhor
encarna o papel de mestre. Poeta que sintetiza algumas das mais importantes
linhas idealisticamente perseguidas na poética eugeniana como a
musicalidade e a aguda consciência de que a poesia é ofício
de artesão.
É no ano de 1939 que, incitado por António Botto, publica
uma plaqueta intitulada Narciso, o seu primeiro poema, ainda com
o nome civil (José Fontinhas). Três anos depois é
dado à estampa o primeiro livro, Adolescente (já
com o pseudónimo), que apesar de ter sido bem acolhido por algumas
notas críticas na imprensa seria posteriormente, por razões
de ordem estética, renegado pelo autor. Esta posição
estender-se-á ao seu segundo livro, Pureza, publicado em
1945. Bastante mais tarde, em 1977, numa edição de conjunto
da sua obra, resgatará dez poemas daqueles dois livros, reunindo-os
sob o título de Primeiros Poemas.
Em 1943, Eugénio de Andrade instala-se na cidade de Coimbra. No
ano seguinte irá para Tavira para cumprir o serviço militar,
que terminará em Coimbra. Trava amizade com Miguel Torga e publica,
em 1946, uma Antologia Poética de Garcia Lorca. Regressa
a Lisboa no final desse mesmo ano e em 1947 ingressa no funcionalismo
público. Publica em 1948 aquele que viria a ser o seu livro de
consagração e o mais reeditado dos seus textos: As Mãos
e os Frutos. Por essa altura faz amizade e convive com outros poetas
como Mário Cesariny e Sophia de Mello Breyner Andresen. Fixa residência
no Porto em 1950. Em 1956 morre a mãe, figura central na sua poesia,
em cuja memória publica, dois anos depois, o livro Coração
do Dia. Datam dos anos 50 os contactos pessoais com alguns poetas
da geração de 27 e a amizade com Teixeira de Pascoaes e
Jorge de Sena. Além dos títulos já mencionados, publica
em 1951 As Palavras Interditas, Até Amanhã
em 1956 e Mar de Setembro em 1961.
É de assinalar um grande interregno na sua produção
poética após a publicação de Ostinato Rigore
(1964); só no final de 1971 dá à estampa novo volume
de poemas: Obscuro Domínio. A interrupção
é importante do ponto de vista da linha evolutiva da obra; trata-se
de um momento decisivo no sentido de uma viragem que resulta na amplificação
da regularidade, que vai de As Mãos e os Frutos até
Ostinato Rigore, em concreto ao nível das gamas lexicais
e semânticas. A partir daqui retoma o ritmo regular que vinha imprimindo
à sua obra. Esta revelará contornos cada vez mais peculiares
que denotam uma aguda consciência do percurso que se vai construindo:
um profundo sentido de renovação, de diferença dentro
de uma nítida linha de continuidade. Daí que os contidos
poemas de um livro da primeira fase como Até Amanhã,
em relação ao qual com propriedade se pode falar de claridade
apolínea, difiram dos poemas do livro anterior As Palavras Interditas,
poemas mais extensos marcados por uma imagética próxima
de alguns textos dos poetas surrealistas. E no entanto a obra prossegue
idêntica a si mesma.
Numa segunda fase continuam a encontrar-se momentos tão diferentes
quando se confronta Véspera da Água (1973) com Limiar
dos Pássaros publicado em 1976. Este livro configura no conjunto
da produção poética de Eugénio de Andrade
uma espécie de nó onde se entrelaçam os principais
núcleos de ressonância autobiográfica, texto denso
do mais radical e perturbante olhar sobre esses núcleos. Outros
textos apresentam nítidas marcas diferenciadoras dentro da continuidade
estilística, podendo alguns deles ser aproximados por afinidades
de diversa ordem, nomeadamente estruturais, caso de Memórias
doutro Rio (1978) e de Vertentes do Olhar (1987), onde ocorre
uma comum matriz de narrativização dos poemas em prosa.
Matéria Solar (1980) é um livro cujo metaforismo
fulgurante se encontra próximo da equilibrada expressão
de apaziguamento que irradia em Branco no Branco (1984). E se em
O Peso da Sombra (1982) é onde mais claramente se manifesta
a melancolia e a aguda consciência da passagem do tempo com seus
efeitos sobre o corpo, a partir de O Outro Nome da Terra (1988)
e Rente ao Dizer (1992) o que se depara é um progressivo
caminhar para o despojamento da expressão, aliado a uma atenção
sábia às pequenas coisas da vida. Os últimos livros
(Ofício de Paciência, 1994; O Sal da Língua,
1995; Pequeno Formato, 1997; Os lugares do Lume, 1998; Os
Sulcos da Sede, 2001) vêm confirmar a busca incessante de uma
linguagem transparente face à pulsação do real quotidiano.
Aspiração máxima da sua poesia: fazer com que a rugosidade
da matéria seja sinónima da luz De rojo não
há poesia; /não há verso / por mais rasteiro/que
não aspire ao alto: estrela / ou farol iluminando o ser /da palavra
(Ofício de Paciência).
Em 1974 publicou Escrita da Terra e Outros Epitáfios,
livro que foi sendo continuamente ampliado, ao longo dos anos, até
ao seu desdobramento em volumes diferenciados (Escrita da Terra,
5ª edição, 1983; Homenagens e Outros Epitáfios,
8ª edição, 1993). |
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